segunda-feira, 10 de março de 2014

A BÍBLIA DIZ E JOÃO CALVINO DESDIZ (De Gênesis a Apocalipse)

Para Calvino, nada há neste mundo, quer no presente ou no futuro, que não seja previamente e inteiramente e cabalmente resultante da providência divina. Tudo o que sentimos, tudo o que fazemos, tudo o que desejamos, tudo o que omitimos, todas as nossas eventuais e escassas virtudes, toda as nossas mentiras, toda a nossa cobiça, tudo o que deveríamos fazer e negligentemente não fizemos, tudo o que falamos; enfim, toda a trajetória de nossa existência terrena encontra-se traçada no mapa invisível e imutável da providência ou predeterminação ou decreto eterno de Deus.

Portanto, quando lemos na Bíblia as preciosas promessas de Deus em relação àqueles que verdadeiramente o temem e o buscam, isto é, no sentido de que haveriam de ser alvos de bênçãos; que seriam como árvore plantada junto a ribeiros de águas; que prosperariam em tudo quanto fizessem; que os anjos acampariam ao seu redor e os livrariam; que mil cairão ao lado dos que temem a Deus, e dez mil à direita, mas não seriam atingidos; entre incontáveis outras passagens bíblicas, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, que trazem alento para a alma do cristão, em realidade tudo isso não passa de um seqüencial de vida completamente ilusório.

E Calvino, placidamente, expõe sua pronta e acabada explicação, assim se expressando:

“Pois, donde acontece que o homem providente, enquanto cuida bem de si, se desvencilha até de males iminentes, o insipiente pereça levado por temeridade, senão que tanto a insipiência quanto a prudência são instrumentos da divina administração para um e outro desses dois aspectos?
Essa é a causa por que Deus quis que não conhecêssemos o futuro, para que, sendo ele incerto, nos preveníssemos e não deixássemos de usar os remédios que ele nos dá contra os perigos, até que, ou os vençamos, ou sejamos deles vencidos.”
“...A suma vem a ser isto: que, feridos injustamente pelos homens, posta de parte sua iniqüidade, que nada faria senão exasperar-nos a dor e acicatar-nos o ânimo à vingança, nos lembremos de elevar-nos a Deus e aprendamos a ter por certo que foi, por sua justa administração, não só permitido, mas até inculcado, tudo quanto o inimigo impiamente intentou contra nós.”
“...Logo, como qualquer mudança entre os homens é correção do que desagrada, mas a correção provém do arrependimento, por isso pelo termo arrependimento se entende o que Deus muda em suas obras. Entretanto, não se reverte nele nem o plano, nem a vontade, nem se oscila seu sentimento. Ao contrário, o que desde a eternidade previra, aprovara, decretara, leva adiante em perpétuo teor, por mais súbita que a variação pareça aos olhos dos homens.” (Institutas, vol. I, formato pdf, tradução de Waldyr Carvalho Luz)

Traduzindo ou parafraseando essas palavras do escritor francês, a nós se nos oferece dizer que vivemos como se efetivamente vivêssemos, mas em verdade não estamos vivendo. Tudo já está ou já foi consumado desde a eternidade, em estrita consonância com os eternos decretos ou com a providência ou com a predestinação de Deus.

Com outras palavras, vivendo o presente como se o presente existisse, e atinando para o futuro como se a respeito dele ou sobre ele pudéssemos ter alguma influência na qualidade de cristãos, estamos tão-somente cumprindo à risca, em todos os detalhes, um insondável e pré-moldado scprit existencial. E se poderia acrescentar, numa síntese a esse pensamento doutrinário de João Calvino: VIVEMOS EM TORNO OU NA EXPECTATIVA DE UM FUTURO COMO SE FUTURO HOUVESSE, QUANDO FUTURO DEFINITIVAMENTE NÃO HÁ.

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