sábado, 24 de maio de 2014

QUANDO A OMISSÃO SUPERA A BARBÁRIE EM SI MESMA

O sistema prisional brasileiro, em inquestionável, palpável e escandalosa verdade, representa um crime hediondo praticado dia após dia, diuturnamente, pelos governantes deste país, na medida em que os detentos (exceto aqueles endinheirados e os figurões engravatados) são amontoados como larvas ou moscas e abandonados em pocilgas fedorentas oficializadamente chamadas de presídio e penitenciária.

Ou seja, o governo republicano, exibindo cruel impiedade, arrebata-lhes a dignidade e, ao mesmo tempo, num paradoxo ridículo e inadjetivavelmente vergonhoso, proclama que no Brasil não existe pena de morte e que o tempo máximo de encarceramento não passa de trinta anos, que a legislação tem o objetivo de promover a ressocialização dos prisioneiros...


Vulcanicamente evidente, portanto, que os governantes que se perfilam diante de uma bandeira cujo dístico contém ironicamente o ridículo mote “ORDEM E PROGRESSO” haveriam de ser submetidos a processo judicial pelo Ministério Público e/ou a procedimento de  impeachment  pelo Congresso Nacional, deveriam ser inequivocamente censurados por vozes audíveis do povo, deveriam ser compelidos a modificar radicalmente suas pocilgas apelidadas de prisões ou penitenciárias, de modo que abandonem esse seu letal jeitão governamental, fazendo pior e fazendo-se pior do que os criminosos que lá estão.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

O SEM SENTIDO E GÉLIDO CALVINISMO

Aconteceu após um culto numa denominação religiosa cristã de orientação chamada calvinista, isto é, que tem como verdadeiro dogma a íntegra e a literalidade da vetusta e pouco conhecida Confissão de Fé de Westminster.

Ao final da reunião solene, uma senhora, vestida sem requintes e com o necessário recato, de semblante revelando exaustão, aparentando entre cinqüenta e cinco e sessenta anos de idade, aproximou-se e deteve-se timidamente diante do Pastor que à porta do templo cumprimentava os irmãos que partiam para suas residências, e pediu-lhe em voz audivelmente discreta que lhe fossem concedidos alguns minutos de seu precioso tempo de Ministro do Evangelho, para um aconselhamento em particular.

Naquele ritual de despedidas pastorais próximo aos degraus de saída, podia-se perceber claramente que o Ministro Religioso dedicava a alguns e determinados irmãos efusivos abraços e largos sorrisos; a outros, um ligeiro aperto de mãos e apenas uma expressão algo amenizada; e ainda a outros mais, um levíssimo tocar de mãos com fisionomia algo sisuda ou de pouco ou nenhum entusiasmo.

Dizendo-se um tanto compromissado com sua agenda, o Pastor, em apressadas palavras,  respondeu àquela senhora (irmã em Cristo) que naquele dia ou momento estaria impossibilitado de atendê-la, e sugeriu que ela entrasse em contato com sua secretária para que esta verificasse disponibilidade e marcasse dia e horário para o desejado aconselhamento pastoral.

Passados alguns dias, e não sem repetidas e frustradas tentativas de avistar-se com a referida secretária, após telefonemas não atendidos, eis que finalmente aquela senhora obteve a aquiescência e a benevolência dessa serviçal do Ministro Religioso, a qual agendou para uma segunda-feira, às dez horas e trinta minutos da manhã.

Necessário o registro de que aquela mulher, embora assídua frequentadora das reuniões solenes, jamais fora contemplada com uma visita Pastoral ou de qualquer dos Presbíteros, ou mesmo de qualquer dos irmãos que como ela e com ela ali se reuniam com  o presumível propósito de honrar o nome do Cordeiro de Deus que Tira o Pecado do Mundo, mesmo não lhes sendo desconhecidos os graves problemas familiares por ela enfrentados desde longa data.

Chegado o dia e momento, eis que aquela senhora, pontualmente, aciona a campainha do portão que dava acesso ao escritório pastoral e, após alguns segundos, fora convidada a entrar, sentar-se num confortável sofá estacionado em um dos cantos de uma espécie de antessala e aguardar que a chamassem.

Finalmente, ao soar do chamado da secretária, vendo-se frente a frente e a sós com o Ministro Religioso, a àquela altura também tímida e frágil senhora pôs-se a narrar-lhe seus terríveis dramas familiares, que consistiam no estilo de vida do único filho que àquela época contava dezenove anos e que desde pouca idade, ainda antes de completados dez anos, já se mostrava inveteradamente desobediente ao pai e à mãe, além de vez por outra aparecer em casa portando objetos que, perceptivelmente, não lhe pertenciam e, portanto, eram produtos de furtos.

Com o passar dos anos, e não obstante todos os esforços daquela dedicada mãe, embora os conselhos e ensinamentos bíblicos que ela insistentemente tentava incutir na mente e no coração de seu filho, as coisas simplesmente pioravam, eis que, de um lado, seu marido não demonstrava qualquer preocupação em relação ao comportamento do filho, optando por dedicar-se a rotineiras bebedices, por efeito das quais normalmente chegava a casa em estado de embriaguez, após o dia de trabalho.

De pequenos furtos, seu filho passou a envolver-se em brigas de rua, afeiçoou-se ao uso de drogas como maconha, cocaína e crack, além de se entregar a hábito arraigado da bebida, tal qual o pai. Todo esse conjunto de comportamentos deu causa a vários episódios policiais, várias prisões, várias visitas que a mãe lhe fazia durante seu encarceramento, sempre levada pelo sentimento de mãe e pelo zelo de uma alma verdadeiramente cristã.

Malgrado todo o seu desprendimento materno, aquele filho simplesmente não dava sinais de qualquer desejo de mudança de rumo e, bem ao contrário, passou a freqüentemente agredir a mãe com palavras de baixo calão e, não raro, tratando-a acintosamente aos empurrões e fazendo-lhe ameaças.

A essa altura, o pai, provavelmente como decorrência e efeito do vício da bebida alcoólica, contraiu grave enfermidade que o impossibilitava de trabalhar, passando a família a contar com o chamado Auxílio-Doença da Previdência Social, e, já com pouca capacidade de locomoção, necessitando de cuidados diários em sua própria cama.

Tentando ser mais sucinta em sua narrativa ao Ministro Religioso, aquela mulher atalhou dizendo de sua extrema exaustão física e psicológica, de sua profunda tristeza, sem ninguém da própria família a quem pudesse recorrer, com o marido praticamente inválido, e sentindo-se em perigo inclusive da sua própria vida, considerando que o filho se mostrava a cada dia mais propenso a violentas agressões, além de simplesmente ignorar por completo o pai que se encontrava prostrado no leito de enfermidade.

Posicionada em frente à luxuosa mesa do Pastor, o qual aparentemente a escutava, ora lançando-lhe rápidas olhadelas, ora remexendo em papéis sobre sua mesa, ora fazendo anotações particulares, ora interrompendo a conversa para atender pessoas ao telefone, ora aparteados pela própria e atabalhoada secretária que irrompia gabinete adentro interrompendo grosseiramente a narrativa, seja para dirigir ao Ministro futilidades verbais quaisquer, ou para perguntar-lhe algo, ou para transmitir recados de sua esposa ou enviados por algum membro ou oficial que desejava estar pessoalmente com ele, a humilde e abatida mulher cristã passou a expor ao Ministro Religioso, com palavras muito simples, dificultosas em razão da pouca instrução, a finalidade primordial de sua busca por aconselhamento, culminando por pedir, já sem conter o fluir de grossas lágrimas, que o Pastor a orientasse sobre o que deveria urgentemente fazer ou sobre que atitude não menos urgente tomar em relação ao filho e ao próprio marido, pois que, enquanto aquele se dedicava exclusivamente à prática de crimes os mais variados e a agressões verbais e físicas contra sua mãe, o pai, assim como o filho, invariavelmente se recusaram e jamais quiseram nem mesmo ouvir a respeito do Evangelho.

E, procurando enxugar as lágrimas com as mangas de seu castigado vestido, aquela respeitável mulher cristã rogou instantemente ao Pastor que ele, como Homem de Deus, fosse até sua casa e conversasse com seu marido e com seu filho, e lá lhes expusesse a Palavra Santa, lhes mostrasse o caminho da Cruz de Cristo, orasse por eles, na firme confiança e esperança de que ambos se mostrassem sensibilizados e pudessem ser tocados pelo Espírito de Deus e, arrependendo-se de seus pecados, receber a vida eterna pela salvação prometida pelo Senhor Jesus.

Silenciando-se aquela mulher por curto tempo e com olhos nele fixos, o Ministro Religioso, parecendo despertar de sua não disfarçada indiferença, deu início ao “aconselhamento” e, em sucintas e apressadas palavras, disse:

- Qual é mesmo o nome da irmã?
- Esmeralda, Pastor.
- Veja bem, continuou o Ministro Religioso - vestido com elegante paletó, camisa de tecido fino, cabelos bem penteados, impecavelmente barbeado, anel de grau no dedo indicando formação universitária ou algo símile. Dizia ele: Deus é absolutamente soberano em suas decisões e todas as coisas se encontram sob seu controle, de tal forma que nada há que possamos fazer para alterar os Eternos Decretos de Deus.
- Não sei se a senhora me entende, mas expressando de outra maneira, as pessoas já nascem salvas ou condenadas. Na verdade, antes mesmo de nascerem já têm seu destino definitivamente traçado por Deus. Significa que tanto seu filho quanto seu marido ou são salvos ou são condenados para a perdição eterna, de modo que orações nesse sentido não surtem nenhum efeito, compreende?

- Nem eu, como Pastor, nem qualquer outro homem, poderia dirigir orações a Deus suplicando-lhe pela salvação de seu filho ou de seu marido, porque, como eu disse, e segundo o que na Bíblia se contém, na irretocável e perfeita interpretação do inigualável doutrinador João Calvino, e também conforme nossa Confissão de Fé de Westminster, Deus elegeu ou predestinou certas e determinadas pessoas para serem salvas, antes mesmo que o mundo existisse; e preordenou todo o restante para a condenação eterna. Portanto, nós de nenhum modo podemos alterar a Eleição de Deus, ou seja, não há oração que produza esse efeito, porque Deus não muda seu eterno propósito.

- Se seu filho estiver entre os Eleitos de Deus, a qualquer momento da vida ele será despertado e transformado, assim como seu marido. E se, ao contrário, eles não tiverem lugar entre os Eleitos, permanecerão nesse estilo de vida até à morte e definitivamente estarão separados de Deus, eternamente condenados.

- Mas, Pastor, balbuciou chorosamente a mulher cristã, o Senhor Jesus prometeu tantas vezes na Bíblia que a salvação está ao alcance de todo aquele que crer. Ele mesmo disse: “Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei”. Já li repetidas vezes aquela passagem do Evangelho de João, capítulo 3, versículo 16, que diz: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”.

- Por favor, implore a Deus que abra uma exceção e inclua meu filho e meu marido entre os Eleitos ou que por piedade apresse essa Eleição ou a manifestação dela na vida de meu filho e de meu marido, porque a Bíblia diz que Deus é Amor, Deus é Misericórdia, Deus é compassivo, Deus não lança fora os que o buscam de todo o coração, Deus quer que todos se salvem. É o que leio fervorosamente na Bíblia e é o que consola meu coração durante minhas incessantes orações, Pastor!!

- Lamento, irmã ... ”Geralda”, não é isso?.
- Não, Pastor, meu nome é Esmeralda.

- Pois é, irmã Esmeralda, essas passagens bíblicas que a senhora menciona são realmente muito bonitas, mas a interpretação delas é que não está correta, como eu expliquei anteriormente. Em suma, a oração para conversão de almas é ineficaz, é inútil, é perda de tempo, compreende?

- Mas, Pastor, eu frequento esta Igreja há anos e sempre gostei muito de ouvir seus sermões e presenciei com olhos e ouvidos muitas vezes o senhor dizer em altos brados para as pessoas se colocarem aos pés da Cruz de Cristo, para O aceitarem como Senhor e Salvador, receberem o perdão de seus pecados e passarem da morte para a vida.

- O senhor mesmo disse isso inúmeras vezes, Pastor! E muitas pessoas, após o seu apelo pela conversão, iam até à frente, declaravam diante de toda a congregação que aceitavam o Plano de Salvação do Senhor Jesus e o Pastor, então, orava por elas e dava graças aos céus por mais essas almas que passavam a integrar o aprisco de Deus!!

- Sim, irmã, mas isso é uma obrigação minha como Ministro Religioso, ou seja, pregar o Evangelho e elevar orações a Deus porque não sabemos quem está entre os Eleitos e quem não está.
- Bem, Pastor, então o senhor admite que tanto pode pregar quanto orar pela salvação de pessoas, considerando que desconhece quem são os escolhidos e quem são os rejeitados. Então, o que o impede de ir até minha casa e orar pela salvação de meu filho e de meu marido?!

- Aliás, eu gostaria que o senhor orasse também pela cura física de meu marido, que tem uma doença grave e já quase não anda mais. Oração pela cura de enfermidades seria diferente de oração pela conversão, é isso? Eu até me lembro da passagem de Tiago 5, versículos 14 e 15, onde lemos: “Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor; e a oração da fé salvará  o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados”.

- Pelo amor de Deus, Pastor, eu peço encarecidamente ao senhor que vá até minha casa, e ore por todos nós, porque minha vida está uma tragédia, meu marido pode falecer a qualquer instante, meu filho pode ser assassinado e eu mesma corro o risco de ser morta pelo meu filho, já que ele, quando está alcoolizado ou drogado, fica irreconhecível, parecendo até possesso!!

De repente, a porta se abre e, novamente com o mesmo grotesco espalhafato, entra a saracoteante secretária do Pastor para, sem qualquer constrangimento e demonstrando lamentável falta de educação cristã, interromper a fala daquela mulher e dizer ao Ministro Religioso que determinada pessoa, a quem identificou como sendo Dr. Fausto Rúbio, acabara de chegar e gostaria de vê-lo, ao que o Pastor efusivamente respondeu assertivamente e, já ajeitando o elegante paletó, preparando-se para erguer-se da cadeira, como se aquela mulher ali não mais estivesse, diz à secretária: - Perfeitamente, é um prazer, vou recepcionar o Dr. Fausto agora mesmo. Prepare um café com biscoitos e sucos.

Ato contínuo, percebendo que a deprimida senhora, visivelmente embaraçada, permanecia sentada na cadeira, disse-lhe: Irmã Geralda, nosso tempo terminou, a senhora nos dê licença. Deus a abençoe.

Envergonhada, profundamente decepcionada e com a alma agravadamente mais dolorida, ainda teve motivação e forças para relembrar ao (supostamente) Homem de Deus que seu nome não era “Geralda”, mas Esmeralda.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

O MUNDO ACABOU

Tanto se falou a esse respeito, tantas predições desorientadas e devaneantes, tantos vaticínios destituídos de mínima consistência, tantas datas extraviadamente apontadas como o terrível dia em que o mundo deixaria de ser mundo, tantos apologetas do fim, tantos anunciadores, ou pré-anunciadores, ou pregoeiros da falência existencial.

Malogrados todos esses numerosos e solenes prenúncios que remontam a décadas e séculos, eis que, sem que a humanidade se desse conta, avançando qual micróbio que corrói pouco a pouco, de dentro para fora, o colapso, afinal, se consumou, muito embora aparentemente tudo esteja em seu curso “natural”, pois que, em verdade, a íntegra da essência da vida já há muito feneceu, putrefez-se, esvaiu-se.

O que diariamente aos nossos olhos se mostra e fervilha não passa de um arremedo de vida perceptivelmente reles, indubitavelmente pífio e diametralmente despido de qualquer consistência. O ser humano metamorfoseou-se num aglomerado de zumbis, caminhando de modo errante, sem bússola, sem deslumbramentos, sem sonhos, sem alento na alma, mascarando-se a cada dia em agonizante expectativa, sem a percepção de que ele próprio e tudo à sua volta evanesceram-se.

A gregariedade permanece teimosamente sendo-nos essencial, não porque dela a rigor a esta altura necessitemos, ou porque por ela ansiemos como se a partir dela poderíamos estar aptos à construção de novos horizontes por cuja trilha seguiríamos ao encontro de algo que nós próprios absolutamente desconhecemos ou simplesmente nem sequer imaginamos.

O enfado, a exaustão física e psicológica, a mesmice que nos despoja de nosso ímpeto de vida, a esterilidade até mesmo das invencionices, os sonhos que se tornam pesadelos, os sonhos irrealizados, os sonhos irrealizáveis, os sonhos que em verdade não eram sonhos, as bobagens rotuladas de sonhos, a utopia do amor ou a incapacidade de amar na acepção genuína; tudo isso representa a lúgubre e fantasmagórica realidade de algo que se foi em definitivo.


Sim, decididamente não há mais mundo. Resta-nos, entanto, a indescritibilidade da esperança representada pela profética promessa Bíblica do Arrebatamento.

sábado, 3 de maio de 2014

MUNDO CLAUDICANTE MUNDO

A esta deprimente altura da muitíssimo longa história da humanidade, se o mundo, tal como enleadamente mundano se apresenta, tivesse pernas, estas certamente estariam cambaleantes, rotas, fétidas e, arrastando-se, prestes a alcançar o seu lugar nenhum.
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